terça-feira, 3 de setembro de 2013

Instrumentos de combate à tortura no sistema penitenciário brasileiro




Somos o país com a quarta maior população carcerária do mundo, atrás dos Estados Unidos, China e Rússia; e a que mais cresceu nos últimos 10 anos. Em 2012, o Brasil registrou 548 mil presos, segundo dados do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), do Ministério da Justiça. Neste cenário é recorrente violações dos Direitos Humanos, com práticas de tortura e maus tratos, sendo a principal causa de reclamações registradas pelo Disque Denúncia, administrado pela Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, compondo 65% das reclamações referentes ao sistema penitenciário.

Como bem afirma o juiz Luciano Losekann, coordenador do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), por se tratarem de instituições fechadas, é muito dificícil de descobrir quando há tortura, pois a palavra do presidiário não tem valor e a do agente público é supervalorizada.

Não existem números oficiais de registros de torturas nos órgãos competentes. A falta de controle, de fiscalização e de acompanhamento como forma de prevenção, a impunidade e a tradição autoritária da ditadura e do período colonial são os principais fatores que contribuem para tal.

Em 2005, o governo Lula criou o Plano de Ações Integradas para a Prevenção e Controle da Tortura no Brasil. Apenas 12 estados aderiram à medida, que previa a criação de Comitês Estaduais de Prevenção e Combate à Tortura, formados por entidades, sociedade civil e poder público. Hoje, apenas Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Espírito Santo e Rio de Janeiro têm leis próprias para o combate à tortura nas prisões.

Um ano depois, o Brasil assinou o Protocolo Facultativo à Convenção contra Tortura e outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes adotado pela Organização das Nações Unidas (ONU). O governo federal se comprometeu a criar o Mecanismo Nacional de Combate à Tortura, equipe de peritos responsável pelas fiscalizações; sendo a lei que o instituiu (Lei 12.547/2013) somente publicada no dia cinco de agosto deste ano, após cinco anos do comprometimento.

Sancionada no dia dois de agosto do presente ano, fica criada com a nova lei uma estrutura específica para o tema dentro da Secretaria de Direitos Humanos, que trabalhará com o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNCP), do Ministério da Justiça. A Secretaria de Direitos Humanos passa então a abrigar o Comitê Nacional de Prevenção e Combate à Tortura, que será o responsável pelo Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura.

É essencial ressaltar a importância da sociedade civil para a promoção da integridade do Sistema de Justiça Criminal brasileiro, a fim de aumentar a confiança da população neste e em em suas instituições. Temos como exemplo disso as três versões do Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH), respectivamente, a de 1996, a de 2002 e a de 2009, que representam momentos onde governos, profissionais e lideranças da sociedade civil de quase todos os estados do país se reuniram para formular uma agenda para proteção e promoção dos direitos humanos. Os estados de São Paulo, Rio Grande do Norte, Pernambuco, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Rio Grande do Sul tomaram iniciativas semelhante, desenvolvendo programas estaduais de direitos humanos.

Aqui na Paraíba, temos um estudo realizado por Luciano Mariz Maia, professor da Universidade Federal da Paraíba e procurador Regional da República, que reconhece que a tortura é um crime de oportunidade e que as ações para sua erradicação devem ser destinadas a "aumentar a dificuldade para a prática da tortura, aumentar o risco de punição, redução da recompensa pela prática da tortura e remoção das desculpas para praticar tortura"; ajudando a diagnosticar a situação da tortura no Brasil.

No Relatório sobre Tortura da Pastoral Carcerária da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), de 2010, órgão que combate a tortura e outros tratamentos cruéis, desumanos e degradantes, é apontada a importância do monitoramento nas instituições:

"O mecanismo de monitoramento constitui um duplo alerta: de um lado, ele funciona para as pessoas privadas de liberdade como possibilidade de apresentar denúncias e relatar as condições de vida na unidade, proporcionando maior segurança para sua integridade psicofísica; por outro lado, as visitas regulares alertam os agentes públicos para o fato de que se houver uma violação, ela resultará em processo e eventual condenação de seus perpetradores, decorrendo de tal naturalmente um efeito inibidor."

É através desses instrumentos e tantos outros que caminhamos em prol da erradicação de todo tipo de tortura, seja em ambiente carcerário ou qualquer outro. É inadmissível encontrarmos em pleno século XXI práticas de tortura e maus tratos que nos remetem à época medieval, sob um Estado Democrático de Direito, onde a dignidade da pessoa humana é considerada um dos fundamentos da República.

Para explicar as possíveis transformações trazidas pela Lei 12.847, a Conectas Direitos Humanos elaborou o infográfico abaixo:





Fontes Bibliográficas:


RELATÓRIO SOBRE TORTURA: uma experiência de monitoramento dos locais de detenção para prevenção da tortura; Pastoral Carcerária da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) - São Paulo, 2010


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